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100 Anos da UFRJ

A UFRJ completa 100 anos

Analisar a história da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que neste ano completa 100 anos de criação, constitui tarefa complexa. Para entender as origens e a construção dessa Universidade e, dentro dela, o significado de determinados fatos e tomadas de decisão é necessário considerar algumas linhas de força do contexto que contribuíram e determinaram sua concretização.

Da Colônia à República, houve grande resistência à ideia de criação de universidades no Brasil. Até o final do período monárquico, mais de duas dezenas de propostas e projetos foram apresentados sem êxito; após a Proclamação da República, as primeiras tentativas também se frustraram. A constituição de uma universidade, apoiada em ato do governo federal continuou sendo postergada, mas o regime de “desoficialização” do ensino superior gerou condições para o surgimento de universidades, que se deslocavam da órbita do governo central para a dos estados.

Nesse contexto surgem universidades, como instituições livres de curta duração (Cunha, 1986, p.198-211). Somente em 1915, na Reforma Carlos Maximiliano, o Decreto nº 11.530 dispõe a respeito da instituição de uma universidade, determinando, no art. 6º: “O Governo Federal, quando achar oportuno, reunirá em universidade as escolas Politécnica e de Medicina do Rio de Janeiro, incorporando a elas uma das faculdades livres de Direito, dispensando-a da taxa de fiscalização e dando-lhe gratuitamente edifício para funcionar”.

Em decorrência, no dia 7 de setembro de 1920, por meio do Decreto nº 14.343, o Presidente Epitácio Pessoa instituiu a Universidade do Rio de Janeiro (URJ), considerando inadiável dar execução ao disposto no decreto de 1915. Embora a criação dessa Universidade seja recebida com reservas, na história da educação superior brasileira, é a primeira instituição universitária criada pelo governo federal. Informação pouco investigada afirmava que a URJ teria sido criada para prestar homenagens acadêmicas ao rei da Bélgica, que visitou o Brasil, em 1920, outorgando-lhe o título de Doutor Honoris Causa. Na pesquisa de fontes documentais (Atas da Assembléia Constituída pelas Congregações dos Institutos de Ensino Superior incorporados à URJ, de outubro a dezembro de 1920, Atas do Conselho Universitário, de janeiro de 1921 a novembro de 1965), esta questão foi esclarecida. Com base nos dados levantados, chegou-se a conclusão que a criação da Universidade do Rio de Janeiro não foi, como alguns autores afirmam, a necessidade de outorgar um título acadêmico ao Rei da Bélgica. O surgimento dessa instituição universitária, tem como fundamento real o desafio inadiável para que o governo federal assumisse seu projeto universitário ante o aparecimento de propostas de instituições universitárias livres, em nível estadual (Fávero, 2004).

O decreto que a instituiu, explicita seu nascimento estruturado na aglutinação de três escolas profissionais existentes na capital da República: a Escola Politécnica, a Faculdade de Medicina e a Faculdade de Direito do Rio de Janeiro. Sua instituição teve o mérito de reavivar e intensificar o debate em torno do problema universitário no país. Tal debate, nos anos 1920, adquire expressão graças sobretudo à atuação da Associação Brasileira de Educação (ABE) e da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Entre as questões recorrentes nesses debates, destacam-se: a concepção de universidade; as funções das universidades; a autonomia universitária e, a questão relativa ao modelo de universidade a ser adotado no Brasil se deveria seguir um padrão único, ou se cada universidade poderia ser organizada de acordo com suas condições peculiares e as da região onde estivesse localizada.

Quanto às funções e ao papel da universidade, distinguimos duas posições: a dos que defendiam como suas funções básicas desenvolver a pesquisa científica, além de formar profissionais, e a dos que consideravam como prioridade a formação profissional. Há também outra posição que poderia talvez vir a constituir-se em desdobramento da primeira: a universidade, para merecer esta denominação, deveria tornar-se um núcleo de cultura, de disseminação de ciência adquirida e de criação da ciência nova (ABE, 1929). Tais questões reaparecem nas discussões da 1ª Conferência Nacional de Educação, realizada em Curitiba, em 1927, a partir da tese As Universidades e a Pesquisa Científica, apresentada por Manoel Amoroso Costa (apud, ABE, 1929, p. 13).

A institucionalização da pesquisa na universidade, entretanto, não chega a ser concretizada em 1920. A respeito, Raul Bittencourt assinala que desde a Regência de D. João VI até a segunda década do século 20 vinham sendo criados cursos e posteriormente escolas e faculdades de Medicina, Direito, Pintura etc. Entretanto, nada havia que se aproximasse de uma instituição universitária pela intercalação dos currículos e pelos objetivos de pesquisa desinteressada. É fundamental não perder de vista que, atualmente há um momento de crise no país, cujos efeitos têm suas repercussões sobre a educação brasileira e, em particular, sobre a educação de nível superior pública. É uma fase em que o papel social das instituições públicas de nível superior deve ser permanentemente objeto de reflexão e discussão. Deve-se reagir a críticas descabidas, mas também apresentar propostas para o efetivo cumprimento de suas funções básicas. Numa democracia, a universidade deve estar voltada para os direitos dos cidadãos e não para a satisfação de interesses particulares.

A UFRJ tem contribuído, mediante seu trabalho e em diferentes momentos de sua história, para o desenvolvimento do país, na graduação e na pós-graduação, na pesquisa e na extensão, mas ainda tem muito a fazer. Neste momento, urge reconstruir e dar continuidade ao trabalho universitário com seriedade e competência, vendo nele um processo contínuo de crescimento e amadurecimento da instituição. É inegável que a construção de uma sociedade ciente dos valores de cidadania, dentre os quais se destacam o conhecimento e a cultura, deverá contar com a participação ativa, eticamente responsável, e com o reforço adequado de todos que participam e integram a instituição. Numa fase em que cada vez mais é priorizada a chamada “sociedade do conhecimento”, o maior desafio será estender seus benefícios a todos os segmentos da população, tendo sempre presente que o trabalho na universidade deve ser um processo em permanente construção.

Referências Bibliográficas

ABE. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO. O problema universitário brasileiro. Rio de Janeiro: A Encadernadora, 1929.

BITTENCOURT, Raul J. Autonomia universitária. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, v.7, n.21, p. 561-563, mar./abr. de 1946.

CUNHA, Luiz Antonio. A universidade temporã. Da Colônia à era Vargas. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1986.

FÁVERO, Maria de Lourdes de A. A suposta outorga do título de doutor honoris causa ao rei da Bélgica e a criação da Universidade do Rio de Janeiro. Educação Brasileira, Brasília, v. 26, n. 53, p. 81-103, jul./dez. 2004.

FÁVERO, Maria de Lourdes de A. e LIMA, Helena Ibiapina. A Universidade Federal do Rio de Janeiro: origens, construção e desenvolvimento. UFRJ/Rio de Janeiro, 2010

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